Pinóquio por Guillermo del Toro: um filme sobre muitas coisas | Resenha Crítica

Pinóquio por Guillermo del Toro

Recentemente assisti a dois filmes indicados ao Oscar 2023, Os Banshees de Inisherin e Pinóquio por Guillermo del Toro. Sobre o primeiro talvez fale em outro texto, esse texto tem a intenção de ser uma resenha crítica ao segundo.

No quesito técnico não tem o que falar. Simplesmente Guilhermo del Toro em seu ápice brincando com massinha de modelar. O resultado é um espetáculo de encher os olhos. Pinóquio por Guillermo del Toro é um primor técnico que consegue passar a verossimilhança de uma mão humana esculpindo madeira de verdade e ao mesmo tempo nos entregar a magia visual que apenas animações conseguem.

Só consigo imaginar o trabalho que deu. Ainda mais se tratando de stop motion, uma das técnicas mais trabalhosas de se fazer cinema.

A Netflix ajuda nesse exercício de imaginação ao postar um making of dos bastidores da produção.

Então os quesitos técnicos de direção, fotografia, edição e etc são pontos pacificados. Trata-se de uma obra prima.

Contudo, gostaria nessa tentativa de resenha crítica de abordar outro aspecto da obra. O roteiro.

Um filme sobre muitas coisas

O roteiro de Pinóquio por Guilhermo del Toro parece querer tratar de muitos temas, isso por si só não é um problema. Mas quase sempre vale a velha máxima, quem quer falar de tudo, acaba não falando de nada.

O Horror da Guerra

O filme inicia narrando a bonita relação de pai e filho que o Mestre Gepeto tem com o jovem Carlo. Relação que é interrompida de maneira abruta pela guerra. Ou seja, já no começo somos apresentados ao primeiro grande tema do filme: uma crítica à guerra e aos horrores por ela causados.

Contudo, parece não ficar claro se tal crítica é um mero pano de fundo da história ou um tema importante do roteiro. Veja, não existe resposta certa, o diretor escolhe o que ele acha melhor para o filme e o público julga se a execução cumpriu esse objetivo, mas ficar em cima do muro é muito ruim.

Voltando ao início do meu texto apenas para exemplificar esse meu argumento. Os Banshees de Inisherin também se passa numa guerra, a Guerra Civil Irlandesa, porém aqui a escolha foi tornar a guerra um mero pano de fundo para a história principal. Eventualmente existem situações e acontecimento relativos à guerra que impactam as personagens e a história. Mas são apenas elementos de roteiro. A guerra não recebe muita atenção. E tá tudo bem. É uma escolha.

Agora, o filme de Del Toro parece querer trazer uma crítica à guerra, porém o faz de maneira muito superficial. Ao menos foi essa a minha interpretação.

Luto

Além disso, e o que corrobora com meu argumento, é que tal crítica aparece e muito rapidamente dá lugar a outro tema, o luto parental. Óbvio desde o começo esse é um tema citado. O filme abre com uma alusão a isso.

Porém, mesmo isso logo é substituído pela inserção do nosso protagonista, o boneco de madeira, Pinóquio. Com esse novo elemento o luto de Gepeto, mesmo que não desapareça, dá lugar ao espanto diante de algo novo, inusitado e desconhecido.

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Preconceito e Religião

O tema da religião também aparece diversas vezes ao longo do filme. Desde Gepeto e Carlo construindo a imagem de Cristo crucificado no começo do longa até momentos mais pra frente onde Pinóquio questiona o preconceito dos fiéis da vila.

Inclusive esse é um dos momentos que mais me tocou. Em uma bela cena o recém-criado Pinóquio, encantado com a beleza do mundo, decide que também quer ir à igreja. Lá chegando é confrontado com a realidade e o preconceito das pessoas, que temem e estigmatizam aquilo que elas não entendem.

Essa cena gera mais pra frente uma das melhores linhas de diálogo do roteiro. Quando Pinóquio pergunta por que as pessoas adoram o Cristo de madeira, mas o odeiam, sendo que ele também é feito de madeira. Só essa fala abre um imenso campo de debate.

A linha que eu interpretei vai muito ao encontro da passagem do evangelho de 1 João, na qual o apóstolo questiona seus interlocutores sobre como alguém pode dizer que ama a Deus, a quem não vê, mas odiar a seu irmão, a quem vê.

Outro ponto pincelado pela trama é a instrumentalização da religião. Como o filme se passa durante o regime fascista na Itália, é possível notar como a religião pode ser usada para fins políticos, como quase sempre foi na história.

O filme mostra como a religião institucionalizada muitas vezes se deita na mesma cama de regimes autoritários para manejar os preconceitos da população para fins políticos. O Pinóquio sentiu isso na pele, quando o Padre e o agente da polícia de Mussolini aparecem na casa de Gepeto para ameaçá-lo.

Contudo, mais uma vez é um elemento que passa rápido e logo dá lugar ao próximo tema.

Ganância e fascismo

Toda a sequência do circo era um elemento indispensável para a história do Pinóquio. Mas ao colocar a história durante o regime fascistas, Guilhermo del Toro consegue colocar um elemento a mais.

Conde Volpe é o típico pilantra que gosta de se dar bem, mesmo que para isso precise apoiar um regime autoritário. Vimos muitos desses pretensos empresários nos últimos quatro anos do Brasil.

O alinhamento da burguesia aos regimes fascistas não é necessariamente um alinhamento ideológico, assim como Volpe não necessariamente ama Mussolini no filme, ele só enxerga no governante uma oportunidade de garantir seus lucros. É como dizem os comunistas, o fascismo é o botão de emergência do capitalismo.

Essa talvez seja uma trama bem secundária, mas ganha certo destaque mais pro meio do filme. Contudo, o filme não se prende e logo dá espaço a mais uma sequência de ação, onde Pinóquio é enviado para um campo de treinamento para crianças se tornarem soldados em nome da Itália.

Essa é a segunda vez que o filme ensaia uma crítica aos horrores da guerra. Dessa vez é até mais aprofundado com o dilema entre o implacável Podesta, que acredita fielmente na causa, e seu relutante filho Candlewick.

Porém isso é mais uma vez abandonado em detrimento do avanço da história.

Família e aceitação

A conclusão do filme apresenta mais um tema discutido. Gepeto finalmente entende que Pinóquio não pode e nem quer substituir seu falecido filho, Carlo. Afinal, o boneco de madeira é uma pessoa diferente, com personalidade própria.

Ou seja, o filme encerra com uma lição de moral. Pais devem entender que os filhos são suas próprias pessoas e não projeções dos pais. É quando Gepeto entende isso que ele aceita Pinóquio como ele é. E é justamente isso que os aproxima, mesmo após a morte.

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Essa foi minha singela análise de Pinóquio por Guillermo del Toro. Apenas para concluir, minhas observações aqui foram única e exclusivamente baseadas em minhas impressões e interpretações da obra. Em nenhum momento elas diminuem o resultado. São apenas apontamentos acerca dessa obra prima.

Quais foram as suas opiniões sobre o filme? Será que ganha o Oscar de Melhor Animação? Fala ai nos comentários.