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V de Vingança e o poder do discurso

Os quadrinhos são uma boa fonte para discutir temas importantes. Como é o caso de V de Vingança e o poder do discurso.

“Acredito na sobrevivência. No destino da raça nórdica. Eu acredito no fascismo. ”

“Oh, sim, eu sou fascista. O que é fascismo? Um termo cujo significado se perdeu no resmungo dos fracos e traidores. ”

“Os romanos inventaram o fascismo. Um maço de gravetos era seu símbolo. Um graveto sozinho pode ser partido. O maço resistiria. Fascismo… força da união. ”

Essas frases soltas e podem (e acredito que devam) parecer chocante. Afinal, trata-se de alguém em sã consciência defendendo uma ideologia totalitária que coíbe a liberdade individual em prol de um falso senso de segurança.

Quando entendemos o contexto do qual foram tiradas, bem, elas não ficam menos chocante.

V de Vingança

Trata-se de um trecho da célebre graphic novel de Alan Moore, V de Vingança. Ou seja, um clássico da nona arte. Nesse trecho podemos entender um pouco mais sobre Adam Susan, o Líder do partido, que governa a Inglaterra distópica com mãos de ferro. Adam está declarando seu amor ao Destino, o banco de dados que a todos vigia. Isto é, metaforicamente o Líder está declarando seu amor ao poder.

MOORE, Alan (roteiro); LLOYD, David (desenho) V de Vingança São Paulo: Panini/Vetigo p39
MOORE, Alan (roteiro); LLOYD, David (desenho) V de Vingança São Paulo: Panini/Vetigo p39

É poético, é forte e é impactante. Uma passagem digna das melhores dissertações filosóficas e que mostra toda a carga política que a HQ traz, bem como as inclinações de seu autor. Contudo, não vamos nos debruçar sobre isso no momento.

Pois, queremos falar de outra coisa por hora.

O poder do discurso

Perceba, que quando trazemos à luz os terríveis acontecimentos de meados do século XX, a saber, os regimes de Hitler na Alemanha e de Mussolini na Itália, ver alguém abertamente se dizer um “fascista” parece estranho se não revoltante.

O fato é que enquanto tece essas palavras o Líder do Partido, o cabeça do regime, não se sente nem um pouco desconfortável. Mas claro, que ele discursa mais para eles mesmo, ou se preferir para o leitor, do que para outro personagem. No entanto, ele não só se sente confortável como parece sentir prazer em defender uma ideologia fascista.

Ele tenta driblar o fascismo das intensas críticas que este sofre da oposição, a qual ele chama de “fracos e traidores”. Tenta ao mesmo tempo exaltar tal ideologia, usando o recurso retórico da etimologia. Tentando resgatar o significado inicial do termo, atribuído aos antigos romanos.

Obviamente o regime não precisa mais de uma defesa teórica, uma vez que sua dominação já se deu através do uso da força militar. Contudo, é necessário perpetuar sua dominação no campo das ideias.

E é por isso talvez que esse discurso seja tão importante. É preciso dominar a mentalidade da população, ganhar a batalha ideológica. Portanto se faz necessário que a ideologia seja populista, e de fácil aceitação. Afinal por mais conservadora que seja a população ela jamais irá abraçar um regime totalitário abertamente, pelo menos não de cara.

Vida Real

Isso não é mera coincidência com discursos políticos atuais. Afinal, muitos figurões da política nacional e internacional utilizam de artimanhas retóricas para legitimar suas posições no mínimo polêmicas.

Quanto preconceito já foi destilado para em seguida ser amenizado por discursos relativistas? Quanto ódio foi pregado em nome de Deus? Quantas regimes ditatoriais foram defendidos em Câmaras de Deputados em discursos amparados por revisionismos históricos e senso torpe de patriotismo?

Vejam só, os discursos são muito importantes. Ou como diria minha mãe: “as palavras têm poder. ” É por isso que muitas pessoas defendem esses mesmos políticos que parecem tão indefensáveis. Pois as palavras ditas repercutem no âmago do cidadão comum e ressoam com seus preconceitos mais enrustidos, legitimando seus ódios mais infundados.

Talvez essa seja a explicação para a eleição ao redor do globo de líderes conservadores com cada vez menos pudor de destilar seu ódio, seus discursos preconceituosos. Talvez essa seja a gênese do fascismo visto em V de Vingança.

Clube do Livro

Enfim, essa é a pergunta de um milhão de dólares para a qual não temos resposta. O fato é que mesmo quarenta anos depois da primeira publicação de V de Vingança essa obra continua atual, e as críticas tecidas por Moore se aplicam muito aos dias de hoje.

Então, esse é um dos motivos que nos fez escolher essa icônica história em quadrinhos como a primeira leitura do ano do nosso mais novo Clube do Livro, o InduBooks. Portanto, se você já leu e está afim de revisitar essa grande obra, ou quer ter um primeiro contato com a graphic novel, você é nosso convidado para se juntar a nós nessa leitura compartilhada.

Quer saber mais? Acesse esse post onde explicamos tudo, ou entre no nosso grupo do Whatsapp.

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