Curitiba, capital do Paraná, a cidade sorriso, um exemplo para o mundo. Mas, existe pixo na Cidade Modelo? Spoiler: sim, muito!
Há exatamente um mês eu fui convidado para cobrir a pré-estreia de dois filmes da produtora Na Real Cultural: “Pixo na Cidade Modelo” e “Trilha Sonora de um Bairro”. A pré-estreia ocorreu no dia 17 de julho (sim, este texto está muito atrasado) na Cinemateca de Curitiba.
Neste texto eu gostaria de falar apenas do primeiro filme.
Pixo na Cidade Modelo
“Pixo na Cidade Modelo” é um documentário em curta-metragem que conta com 15 minutos de duração. O filme é escrito e dirigido por Willian Germano.
Como o nome sugere, o filme aborda a questão da pichação em Curitiba. Seria ela uma forma de arte da juventude de uma classe excluída dos circuitos culturais ou é só poluição visual mesmo? Não entendam errado, o filme não tem medo de assumir um lado. Afinal, neutro é shampoo pra bebê.
O filme toma o lado dos pichadores, trazendo depoimentos de pichadores famosos no mundo da arte urbana. Além da fala de pesquisadores. Tudo isso muito bem costurado com imagens que criam o clima para o espectador mergulhar nessa subcultura da capital paranaense.
A ideia é mostrar que pichadores são “pessoas comuns”, que trabalham, estudam, amam e vivem. Contudo, são pessoas que são privadas das fontes de lazer e entretenimento. Veja bem, quantos teatros existem na quebrada? E cinemas? E livrarias?
Como alguém que vive na quebrada posso assegurar que existe um paradigma antiacadêmico, que contrapõe a sabedoria das ruas à sabedoria dos livros. Mas, isso é retroalimentado pela elite intelectual do país, que divide a alta cultura, aquela vista em teatros e na Universidade, e baixa cultura, a cultura popular, da quebrada. Ou seja, a elite olha pra gente de cima e numa tentativa ao mesmo tempo de preservação e revide a quebrada ignora tudo que é alheio a ela, abraçando sua própria cultura.
Disse tudo isso pra provar que a quebrada não é burra, nem sem cultura, como muita gente acredita. Mas antes tem sua própria cultura. “Pixo na Cidade Modelo” é uma tentativa de mostrar que a pichação é parte dessa cultura.
Não adianta tentar nos apagar
Outro ponto levantado no filme e que reforça o título é a inserção dessa arte na capital paranaense, a Cidade Sorisso.
Para isso, o documentário relembra a época da Copa do Mundo, onde uma higienização da cidade. Isto é, a prefeitura investiu em pintura nas das ruas e políticas afins para maquiar os problemas da cidade. Habitações precárias, falta de saneamento básico, ruas sem asfalto, tudo isso foi encoberto com cores alegres e vibrantes e bandeirinhas verde e amarelo. Para dar a sensação de que Curitiba continua sendo Cidade Modelo, sem lidar com os problemas estruturais. Pra inglês ver, como diz o ditado.
Parece até uma esquete do Porta dos Fundos.
Mas o filme mostra o contragolpe. Afinal, não adianta a prefeitura e a burguesia apagar o pixo, pintar os muros de branco ou cinza, para higienizar a cidade. Os pichadores vivem e resistem e vão picha de novo para incomodar mesmo, para mostrar que continuam aqui, mesmo com as tentativas de invisibilização de suas vidas.
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Muitos motivos um só pixo
Além disso, outro ponto que merece ser citado diz respeito às motivações que os pichadores tem pra pichar.
Nos depoimentos trazidos alguns citam a vontade de fazer uma arte própria, outros dizem que fazem pela emoção da contraversão e outros trazem na fala o pixo como forma de protesto.
Eu particularmente me alinho muito mais a última vertente. (Por responsabilidade jurídica meu advogado me orientou a declarar que não faço pichações, apenas pro caso de algum policial estar lendo esse texto). Eu acho que a pichação deve incomodar mesmo, pra mostrar que os excluídos tem voz e não vão abaixar a cabeça.
Mas o documentário em nenhum momento moraliza a questão. Seja qual for o motivo para sua pixação ela é legítima. O pixo vive e respira. A gente precisa enquanto sociedade escolher a maneira como lidamos com ele. Portanto, “Pixo na Cidade Modelo” é um bom começo para tirar o status de tabu dessa questão.
Essa foi minha singela resenha crítica, espero que você tenha curtido e aberto sua mente. Caso tenha curtido o texto, siga nossas redes sociais para mais conteúdo e continue acompanhando nosso site.
Valdirzera é definitivamente um dos autores do InduTalks. Fez filosofia, mas se formou em Publicidade e Propaganda. Adora quadrinhos, livros, série, filmes e todo tipo de nerdice. É apaixonado por produção audiovisual e sonha em um dia dirigir um longa metragem.