Friends é muito mais profundo do que você se lembra

Friends é mais complexo do que você lembrava

A sitcom dos amigos é divisiva, pois faz a linha ame-a ou odeia-a. Contudo, se você der uma chance vai ver que Friends é muito mais profundo do que você se lembra.

Recentemente Friends foi redescoberta pela internet e se tornou rapidamente uma das sitcons mais amadas do público. Porém veio junto uma onda de pessoas que assumiram não gostar nenhum pouco da produção dos anos 90.

Reclamações

Entre as reclamações mais comuns estão que algumas piadas são forçadas, os perosnagens não evoluem, além é claro de muitos preconceitos e piadas problemáticas que marcam a série como um produto do seu tempo.

Mas, eu não gostaria de falar aqui sobre nenhuma dessas reclamações. Tampouco fazer uma defesa da série. Afinal todo mundo tem o direito de não gostar de algum produto da cultura pop, não importam quão popular ele seja. Antes quero aqui me aprofundar em uma reclamação bem comum, a de que as tramas dos episódios seriam muito rasas e superficiais.

Em muitos dos episódios isso é verdade. Os seis amigos tendem a viver situações muito corriqueiras e sem muito apelo, transformando pequenos problemas cotidianos que qualquer adulto funcional enfrenta em verdadeiras tempestades em copo d’água. Mas existem momentos em que isso não é o caso.

The One Where Phoebe Hates PBS

Gostaria de trazer um exemplo paradigmático de um episódio em específico, que aborda, mesmo que superficialmente um debate filosófico que eu considero muito interessante. Trata-se do quarto episódio da quinta temporada, intitulado “The One Where Phoebe Hates PBS” (Aquele em que a Phoebe odeia a PBS, em tradução livre).

Na trama do episódio em questão, Joey (Matt LeBlanc) aceita participar do Teleton do canal de TV PBS. Phoebe (Lisa Kudrow) então argumenta que odeia a PBS, por eventos do seu passado. Além disso a personagem diz que a atitude do amigo seria um egoísmo disfarçado de boa ação, uma vez que ele não queria ajudar as pessoas, mas sim apenas aparecer na televisão. Então temos uma linha de diálogo aparentemente simples, mas que resume uma disputa filosófica muito longa.

Joey responde à amiga que não existem ações verdadeiramente altruístas, mesmo às boas ações são feitas por motivos egoístas. E é essa provocação que move o arco de Phoebe nesse episódio. Ela está dispostas a provar que Joey não está certo e que existem ações verdadeiramente altruístas.

Esse é um tema que já dividiu cientistas, biólogos e até mesmo filosófos.

Cientistas x Filósofos

De um lado ficam alguns cientistas e teóricos que, munidos de argumentos evolucionistas, defendem que graças a seleção natural todos os seres buscam a própria sobrevivência, portanto toda e qualquer ação deve visar em primeiro lugar o benefício próprio.

Do outro lado estão aqueles que defendem a que a natureza humana nos possibilita superar nossos instintos mais primitivos e, portanto, colocar o benefício de outros na frente do nosso.

Essa é uma questão que colocou dúvida até na cabeça do pai da Teoria da Evolução. O biólogo Charles Darwin, em sua obra mais célebre, A Origem das Espécies, ao se debruçar sobre o comportamento das formigas, questiona o papel do egoísmo puro na seleção natural dos indivíduos. O biólogo observou que em dentro dos formigueiros, os indivíduos tendem a se ajudar coletivamente, ao invés de competir mutuamente entre si por alimentos e condições de vida.

Muitos teóricos analisam esse comportamento como benéfico para a espécie, portanto benéfico para o indivíduo, mesmo que o mesmo se coloque em perigo com tal atitude. Logo não seria uma ação inteiramente altruísta, visto que em última análise o indivíduo se beneficia, mesmo que de maneira mínima.

Porém, alguns humanistas defendem que existem sim ações destituídas de egoísmo. Como exemplo, pessoas que fazem boas ações para desconhecidos em situações de extrema pobreza ou para refugiados de guerra.

No entanto, se quisermos concordar com Joey, podemos dizer que essas pessoas agem assim para se sentir um pouco menos desconfortáveis com o mundo. Numa tentativa de aplacar uma espécie de culpa interna. Claro que esse argumento também pode ser rebatido, mas muitos discursos que seguem boas ações vão nessa linha.

Conclusão

Esse texto já ficou muito extenso e eu não sei se eu consegui provar alguma coisa. Se eu posso finalizar com alguma coisa é que às vezes as reflexões mais profundas vem dos lugares mais inesperados. E, para finalizar, gostaria de dizer que eu me posiciono ao lado da Phoebe nessa, afinal eu também não quero viver em um mundo onde o Joey esteja com a razão.

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