Os vilões estão em alta na Cultura Pop, Coringa está aí para provar que eu não estou mentindo. Talvez pelo fato de estarmos cada vez mais descreditados com os valores morais da sociedade ocidental, quem sabe? Mas não cabe aqui investigar a origem desse fenômeno. O que faremos é tentar entender três formas para se trabalhar o vilão como protagonista.
Cabe ressaltar que nenhum desses artifícios é novo ou exclusivo das produções cinematográficas, contudo, como são as que se destacam atualmente, vamos focar nosso texto nos filmes ditos de “super-heróis”.
Sem mais delongas, vamos tentar responder (com ênfase na palavra tentar) como Hollywood vem trabalhando os vilões. Para tanto apresentamos a seguir três formas de trabalhar o vilão como protagonista.
Dê a ele um vilão ainda mais malvado
Eis a primeira das três formas de se trabalhar o vilão enquanto protagonista.
Falando em vilões protagonistas, não podemos deixar de citar o Universo Cinematográfico (ou quase isso) de Heróis da Sony. Um Aranhaverso sem Homem-Aranha, até o momento.
Não é de hoje que o estúdio que surfar na onda de universos compartilhados de personagens dos quadrinhos – e quem não quer? Porém, o modo como eles escolheram fazer isso é um tanto peculiar.
Detentores dos direitos dos personagens ligados ao cabeça de teia, a Sony decidiu lançar filmes derivados do teioso, focados justamente nesses personagens, principalmente os vilões. Louco, né?
O primeiro desses filmes foi o do Venom, com Tom Hardy no papel principal. Tudo bem que nos quadrinhos o simbionte já deixou de ser um vilão, se tornando um anti-héroi. Mas a gosma preta vinda do espaço é mais conhecida por ser uma pedra no sapato de Peter Parker, portanto acredito que caiba nessa lista. Sem contar que no início do filme ele come as pessoas (literalmente) e quer junto com seus amigos simbiontes assumir o controle do planeta para ter mais refeições humanas, diga se isso não é algo digno de vilão.
Contudo, a estratégia usada é a mais comum quando se coloca o holofote de uma história em cima de um vilão. Dê a ele um vilão ainda mais malvado. No caso de Venom, a tática é exatamente a mesma que a Marvel utilizou nos quadrinhos. Eddie Brock (Tom Hardy) vai para São Francisco e se depara com a Fundação Vida e seu fundador Carlton Drake (Riz Ahmed), que se prova do mal, posteriormente se unindo com Riot, um simbionte ainda pior.
Ou seja, usa-se um antagonista para o vilão que se importa ainda menos com qualquer código moral. Aí o vilão se torna um anti-heroí, podendo ou não retornar ao status original ao término da história.
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Crie uma empatia com ele.
Essa é uma alternativa nem tanto utilizada, talvez por ser mais restrita quanto a quantidade de personagens em que pode ser usada. A segunda das três formas de trabalhar o vilão como protagonista, funciona melhor com vilões complexos e com background mais trágico.
Como é o caso do Coringa, não só no futuro filme de Todd Philips, mas na célebre HQ “A Piada Mortal” de Alan Moore. Nessa história, Moore cria um possível passado para o vilão como um ladrãozinho com uma vida horrível que, em um assalto mal planejado, dá de cara com o Batman e o resto vocês já sabem.
Outros personagens também podem ser enquadrados aqui, como é o caso de Thanos. Apesar de não ter uma origem tão trágica, suas motivações são complexas. E o personagem é tão explorado que chega a ser humanizado, o que é irônico, visto que ele é um alien.
E é justamente nessa pegada que vai ser o próximo filme de Joaquin Phoenix, Coringa. Arthur Fleck é um comediante fracassado que só se ferra, o que o leva a quebrar e se tornar o icônico palhaço do crime. E isso em nenhum momento legitima as ações do personagem, tampouco tornam o filme tóxico, irresponsável ou perigoso. Mas isso é papo para outro momento.
É uma estratégia de aproximação do público com o protagonista, onde você entende a complexidade do personagem, e as linhas entre bem e mal, herói e vilão, acabam ficando turvas.
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Dane-se as regras, ele é um vilão, ora bolas!
Agora entramos num ponto polêmico. Esse modo de tornar o vilão em protagonista é o mais complicado dos três e o mais difícil de acertar, por isso o menos utilizado.
Aqui não se trata de tornar o vilão em uma boa pessoa, ou tentar explicar a origem de sua maldade, relativizar suas intenções. Aqui o vilão assume sua vilania nata e mata geral mesmo, sem se importar com qualquer código moral.
Poucos são os longas que assumem isso e se saem bem. Podemos citar dois, Fragmentado, filme de 2017 do diretor M. Night Shyamalan (ele mesmo!). Nesse filme Kevin (James MacAvoy) possui 23 personalidades, uma mais bizarra que a outra, e sequestra três adolescentes que encontra em um estacionamento.
O outro exemplo é Brightburn – Filho das Trevas, filme lançado esse ano do diretor David Yarovesky e produzido por James Gunn. O filme é basicamente uma história de origem do Superman, caso ele fosse um psicopata. É isso mesmo, o guri chamado Brandon Breyer cai em uma fazendo no interior dos Estado Unidos e é criado por um casal de fazendeiros. Porém ao invés de se tornar um símbolo de esperança o garoto decide tacar o f*d@-se e sai matando todo mundo que fica em seu caminho.
São dois exemplos pontuais, os dois se saem bem, mas não é algo que qualquer diretor ou roteirista consiga dominar facilmente. Vai contra toda convenção de storytelling, pois você não cria empatia alguma com seu protagonista, portanto a trama deve ser muito boa para motiva o espectador a continuar assistindo.
Esses são exemplos, apenas três formas possíveis de trabalhar o vilão no papel principal. São como como se fossem estruturas de roteiro para se usar quando se quer que a história seja guiada do ponto de vista do vilão. Claro não são as únicas, mas são as mais usadas. E não porque o filme X ou Y usou um e fracassou, ou usou outra e se deu bem, que a estrutura em si é ruim ou boa, vai muito da produção (direção, roteiro, etc.). Portanto use-as de maneira adequada em seu roteiro.